No
decorrer da vida, nesses cursos de fotografia e design que fiz, posso me dizer
especialista na parte técnica e na parte estética da coisa. Só não consigo
abstrair do pensamento alheio. Nessa época, onde as redes sociais andam á todo
vapor, como uma vertente plena da vida do homem ou até mesmo de organizações e
empresas, caímos numa pergunta simplória e até vulgar: o que uma foto diz de
você?
Aquelas
fotografias antigas, do começo do século, idealizavam o padrão de visão ideal,
daqueles ideais de perfeição tão presentes que circundavam a família, o estilo
de vida, os penteados e comportamento social. A aparência era (e ainda pode
ser) a assinatura da felicidade. Aqueles patriarcas impecáveis e inatingíveis,
cercados de sua esposa e filhos; suas expressões às vezes evidenciavam um
indisfarçável desconforto ou seriedade. No entanto o arquétipo postural era o
que regrava a imponência e as pessoas se utilizavam dessa "máscara
emocional" para disfarçar dores, opressões e dificuldades dessa época.
Isso mais facilmente visível nas mulheres, que ou estavam sisudas, ou com uma
longa piteira e olhar indiferente.
Aí veio a
depressão de 29, e todas as máscaras caíram. O esforço pela felicidade
continuava, ainda, como uma forma de mascaras a família perfeita e suprimir os
sofrimentos passados. Isso foi até os anos 60, quando as primeiras fotos
transgressoras começaram a se evidenciar; transgressoras, claro, no sentido
filosófico. Até a pornografia do começo do século era feita como se fosse um
quadro renascentista ou algo assim. Mas os Beatles, Janis, Jimmy, e mais alguma
pequena coleção de balacos, transformava a fotografia de forma definitiva. Não apenas a fotografia, mas o conceito de imagem em geral. E
aquela velha perfeição que acabou na pira de Woodstock, renascia de maneira mais
arrojada, espontânea, com um cigarro aceso (na melhor das hipóteses); foi aí
que o velho filme definitivamente queimou.
Renascia então das cinzas visuais,
um retrato não mais falado, mas berrado; minuciosamente gritado ao som dos
acordes cada vez mais rebeldes. Insisto sim em colocar, lado a lado, a música e
a fotografia. Um hábito muito comum entre adolescentes do começo dos anos 2000
era musicalizar uma imagem, criando um post com um tema musical. E a coisa
funcionou tão bem que os blogs fotográficos tiveram seu grande
"boom". Fotografia cria inspiração, assim como a música. Numa música,
você eterniza aquele momento. Afinal, veja: há quem não ouça aquela música e
lembra daquele primeiro amor, ou daquele(a) namorada(o) filho(a) da puta? Ou
daquele fim de semana em Ilha Grande? Ou daquele aniversário na Lapa?
Entramos em pauta n'
outro traço da câmera digital: o chamado "eu me amo". Quem nunca
bateu algumas dezenas de fotos sequenciais e postou algumas? No filme, era
impossível saber o resultado até a revelação. precisávamos de técnicas,
macetes, segredos e estilos para ter um bom resultado. Só quem se lembra
daquelas fotos, daqueles aniversários, todas embaçadas, escuras, ou com aquela
luz superexpostas. Os anos 90 trazem várias recordações desse tipo, aquele
aniversario de 10 anos com fotos cheias de riscos e luzes incorretas. A câmera
digital não. Ela permite nos corrigirmos, o tempo todo; encontramos nosso
melhor ângulo em tempo real; capturar uma imagem com rapidez e precisão.
pessoalmente eu acho que perdeu um pouco do quê artístico. Mas é um pensamento
como quem compara Miguelângelo à Picasso. Vale um paralelo: Miquelângelo era
genial e humilde, Picasso um gênio arrogante. A arrogância do eu cria imagens
estranhas e deslocadas de si mesmos. Acompanho a vida de alguns amigos pelas
redes sociais - já que meu tempo me impede de um convívio mais presente - e
vejo coisas que não condizem com eles. Fotos musicalmente estranhas, de inspiração
baixa, sem arte e sem espontaneidade. Desconheço algumas pessoas nelas, mesmo
os queridos. Criticam o photoshop na playboy, mas ninguém posta foto de cara
feia, suada ou espinhenta.
Somos
enfim o que nossa imagem transmite; e essa preocupação vai nos envelhecer muito
mais rápido. Não há Pitanguy que seja páreo para o Adobe.