“Irmãozinho, faça um canto das dores do teu martírio:
Se o amor se muda em ódio,o lodo se troca em lírio.
Lance fora esta tristeza, tire um verso do cansaço.
Mesmo com canoa boa, é preciso ter bom braço.” (Aldir Blanc)
"De todas as partes que somos, de todas as partes que temos. Tenho dores indulgentes e lascivas.
Pesada é a culpa de quem se olha e se vê. Vê com verdade. Com a mais rara de todas as sinceridades.
As pessoas hoje andam pelo mundo cegas, em sua maioria, vagando por jardins e sombras anestesiantes, se recusando a enxergar a realidade de seus próprios principios.
O decorrer de tudo nos faz esquecer quem são, cria outra pessoa, uma estátua que subistitui a realidade. Um robô automatizado pelo cotidiano. E sim: isso é uma acusação."
[...] 8h depois...
"Quem é você" perguntou assustado ao ver a sombra na escuridão...
"Sou Érebo, sou a noite eterna; sou mãe dos que se escondem da luz do dia. Sou madrasta dos que cobrem o rosto, e carrego comigo verdades indizíveis..."
Ao seu lado, estava Hipnos. Que se aproximou lentamente e se apresentando em sussurros e abraço.
Agora estava ele, Érebo e a noite sem fundo. Testemunhando estrelas absurdas, cantando a silenciosa canção da madrugada, ela dizia, serena:
"Observe-os; eles gritam para afastar o silêncio; bebem para trazer palavras e se entorpecem para criar verdades. São zumbis da realidade, povoam a noite que jamais será povoada. Vivem num jardim de seda e areia, dançando em torno das ninfas e hecates. Cantarolando súbitas sonolências e nunca se entendem. Ao fundo Eros e Baco, sorridentes. Observe!"
Ele olhava com dor e respeito. Estaria sonhando? Ou estaria mais acordado que o resto da noite? A insônia varria sonhos e vontades. Um cigarro. Cheiros pungentes. Lírio e saudade: verdade.
Ela o deixou ali, pensando. E mesmo tanto assim, não foi suficiente."
R.
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