29 de set. de 2013

Gosto se discute sim...

Sou do tipo que - admito! - já tentou assistir BBB e a Fazenda pra enxergar o que as pessoas gostam tanto naquilo; pra ser sociável, ter assunto no escritório, no bar, sei lá... Afinal, não é qualquer um que gosta de falar em segunda guerra mundial, quasares, buracos negros, mitologia, astrofísica, espiritualidade, orientalidade, poesia, séries ou filmes totalmente alternativos, e outras sutilezas pesadas como as minhas. Mesmo com esse balaco de TV moderna, já tentei extrair disso algum assunto que fosse interessante, empolgante e - pasmem! - construtivo. Tentei ver novela e me distrair com aquilo. Não funcionou. Houve uma época em que tentei assistir Zorra Total, tamanhos eram os comentários, piadas e frases de humor usadas de lá. Humor que não entendia. Não via graça, não surtia aquele efeito estranho, não alcançava; sei lá o quê. Há quem venha dizer aqui que seu azedo. E talvez até seja um pouco. Mas veja, não se trata de gosto simplesmente: um cara que abaixa as calças de alguém no pátio da escola é engraçado uma vez. Na segunda, menos; na terceira, nenhuma. Mas um que abaixa as próprias calças, é e sempre será um grande idiota.


Acho que na TV aberta se abaixa muito as próprias calças. Aliás, no Brasil, em geral. Mentiu quem disse que nossa bunda não está exposta na janela pra passar a mão dela. E continua divertido.


R.

Perdão - ou "um instante que muda tudo."






Hoje pedi perdão a alguém que ofendi, sem querer. Alguém subordinado a mim. Ver aqueles olhos se iluminarem de novo foi ótimo. Revigorante pro espírito. Me fez pensar em coisas bem interessantes a respeito de mim mesmo:

Quantas vezes ofendo alguém sem perceber, sem me notar?
Quantas vezes posso ser injusto simplesmente porque é mais cômodo a mim?
Quantas vezes pode-se começar de novo, começar melhor, começar feliz, limpo das injúrias do passado?
Quão melhor posso ser hoje, e me tornar melhor com coisas tão simples e tão perfeitas?
Quantas vezes um sorriso estranho pode revigorar suas energias e seu entusiasmo, da maneira mais simples e bela que há?
Quanto de nós se perde por simplesmente preferir deixar as coisas como estão?
Quanto de si se aprende quando nos preocupamos com o outro, seja o outro quem for?


Sem conclusões. É um instante que muda sua vida inteira...

60 segundos submersos em mim.


Um pedido particular, vindo diretamente entre acordos com diretores e gerentes, chega às minhas mãos. Um exame comum, de radiografia dos pulmões. Quase uma cortesia, uma gentileza por assim dizer. De perto, um senhor distinto, de terno e gravata, com olhos gentis e pequenos, ostentando uma fisionomia cansada, pastas cheias de papéis, carteira cheia de cartões e notas altas que num movimento brusco ele fez, de certo modo, questão de ostentar às vistas curiosas do entorno; analisando com mais proximidade, vi movimentos trêmulos como de quem vivesse a angústia constante de ter que estar em algum lugar, fazendo algo. Algo bem conhecido por mim, ultimamente. Se disse viúvo, mas ainda usava seu anel de casamento dourado, vivo, contrastando sua pele desgastada e pálida. Em meio a todas essas conversas pessoais das quais já tinha há tanto me afastado por não lidar mais com o público, surpreende um sussurro daquela pobre criatura, direcionado a mim e ouvido apenas por mim: "Estou com suspeita de câncer...". A frase fazia vazar por entre todas as expressões que os anos estamparam em sua face toda doçura e inundavam preocupação; os mesmos olhos de 3 minutos atrás. Fiquei sem fala. Fiquei sem ação. Me virei um instante enquanto ele continuava: "Tenho me sentido tão só, com vontade de chorar, estou sempre tremendo, e sempre muito, mas muito triste. Fumei demais. Agora estou mais doente, mais triste e mais nervoso." Falou com mais firmeza, talvez tentando demonstrar uma força que não mais existia; mas a voz tremulava falsetes nas palavras finais de cada oração, para denunciar a fragilidade perturbadora que aquele pobre homem carregava por dentro. Leonino, vaidoso, de sapatos engraxados e terno bem alinhado, que poder esse homem pensou ter antes de testemunhar sua própria vulnerabilidade? Me subiu a frase "Não sou médico, senhor." Mas desceu-me o verbo, como desce garganta abaixo de quem engole um remédio ruim. Eu mesmo, tantas vezes senhor do absoluto, das verdades incontestáveis da vida; dos absurdos dos quais me vitimei. Eu, você, ele, eles e elas. Isso.
Fico na dúvida se o tempo realmente nos endurece; no fundo, acho que amolece - carne, pele, osso e alma - nos faz temer, nos faz chorar; arrogantemente nos recusamos a sentir. Nos sentimos agredidos pela vida quando somos assaltados por um problema, ou uma mudança de planos. Nos recusamos a enxergar que a vida nos amolece, aos poucos, desde a virilidade adolescente infalível e imortal em toda sua crença até a resignação inevitável das rugas e cabelos que embranquecem e se vão; o tempo não cura, o tempo nos adoece. E mais importante que nunca é sabermos que a vida nos fala, nos comunica todo o tempo. Nos pede amor, nos pede vida, nos pede bondade. Nos pede coisas que recusamos por capricho; por sentir a derradeiro sentimento de superioridade na mais efêmera vontade de mais. Vontade material, desejo que consome. Somos todos aquele senhor. Pensei nisso, em tudo isso, por 30 segundos, enquanto um quadro se formava em minha mente, um muito familiar dentre todos nós, talvez a Monalisa de todas as entrelinhas do mundo, a fatal coincidência que corrói a todos, lentamente, oxidando fatos do ventre ao túmulo: a certeza. Não quis olhar - nem por curiosidade mórbida, seu laudo. Mas de certo modo, tive um laudo preventivo em mente 100% aplicável a mim, a você, e todo o resto.




R.

13 de set. de 2013

Depois dos gritos, um sussurro...



Sussurro de independência numa sexta feira 13: Azar o seu! É como eu digo. Somos um país movido à bunda e futebol. O RIR e a copa calaram a multidão, como previsto.Temos memória curta e seletiva. Falei isso desde sempre: esses protestos eram muito mais desequilíbrio hormonal adolescente que revolta e injúria. Nunca desencorajei ninguém a lutar pelo que acredita. O problema é no que se acredita... é triste. Até dói pensar. Mas é só isso. Azar o meu, seu e de todo mundo.





8 de set. de 2013

A lua eclipsando Vênus...



Total eclipse of the heart? rs...

Uma metáfora perturbadora...


"Suponha que eu saia agora, escolha uma pessoa qualquer na rua, de modo fortuito, agarre em sua mão e a acompanhe lado a lado com o objetivo de agradá-la. “O que você gostaria de comer? Curtiu aquele sapato? Você tá bem hoje? Aceita um banho bem quente assim que voltar para casa?”

Suponha que eu não desgrude mais dessa pessoa, por meses, décadas, e que não faça nada além de me dedicar a montar uma vida na qual ela seja feliz.

“Quer namorar? Tudo bem, procuro outra empresa. Vamos comprar uma cama nova? E como está seu extrato bancário? Dá uma lida nesses textos, precisamos escolher um psicólogo.” Suponha que eu me interesse tanto pela vida dessa pessoa, que eu sinta raiva de quem a maltrata, ciúme quando seu namorado desvia o olhar, orgulho de seus feitos, inveja das alegrias alheias.

Aceito, me identifico, concordo com tudo o que ela pensa e fala, como se essa pessoa fosse meu centro de gravidade. Brigo e a culpo, porém me sinto culpado junto. Pago por cirurgias plásticas assim que ela começa a se sentir feia. Eventualmente enxergo e beneficio outros seres também, mas só aqueles relacionados à pessoa, que ela chama de meu ou minha alguma coisa.

Na verdade, tenho muita dificuldade em ajudar essa pessoa. A gente combina de cortar tais e tais hábitos negativos, a gente se planeja, mas muita coisa fica parada. Não importa o quanto eu a entulhe de experiências, sempre acabamos frustrados, insatisfeitos. É um relacionamento que me exige muito! Mesmo assim, eu não consigo mais imaginar minha vida após a morte dessa pessoa.



OK, enquanto você ficou imaginando toda essa história, te pergunto agora: me achou maluco, fixado? Ficou abismado, sem entender por que eu desperdiçaria todos os dias da minha vida correndo atrás dessa pessoa?

É absurdo considerar a ideia de me agarrar e me tornar serviçal perpétuo de apenas uma pessoa, mas parece perfeitamente natural quando essa pessoa sou eu. Seguir impulsos, emoções, crenças e visões de mundo de outra pessoa é escravidão… no entanto, o que muda quando essa outra pessoa por acaso é você?

Pois é assim, igualmente agarrados, que vivemos. Não somos nem um pouco diferentes.

A boa notícia: dá para soltar as mãos dessa pessoa que nos acostumamos a mimar, olhar bem ao redor e direcionar nossa atenção e nosso tempo a estranhos, desconhecidos, incontáveis pessoas que nunca habitariam nosso mundo, mas cujas vidas estão ali, escancaradas, para a participação de todos.

É quando minha vida deixa de ser minha que ela começa...."



2 de set. de 2013

Melancolia (Ou "Meu Texto Proibido")

Tinha jurado jamais publicar isso. Mas alguns juramentos são feitos para se quebrar...


Dezembro de 2010


E esse verão esquentando os edredons. É nos edredons que me escondo do mundo. Enquanto todos se banham nas praias, fico aqui, fingindo ver a vida passar, mentindo as horas pr'os ponteiros acelerarem. Esse ano nunca acaba. É como meu estoque de lágrimas. Mas nessa manhã especificamente, onde às 8 da manhã faz 30 graus sob o sol cegante que insiste em invadir espaços de minha cortina, e nem posso dizer que acordei pois ainda não dormi, me sinto seco. Culpa - duvido - do vinho que tomei sozinho, 3 garrafas de merlot. 3 garrafas de meu sangue engarrafado, que insisto em jorrar nas circunstâncias pra criar o mártir da solidão. Talvez nem seja bem, eu, um homem que chorou até secar suas lágrimas. Esse foi Bukovski, e, vai entender o que ele sentiu de verdade. Talvez nem seja eu simplesmente a representação viva de um lamento. A realidade é que mundo nunca gostou muito de mártires, menos ainda de mártires de si mesmos. Os poetas que definharam na história são apenas idiotas dos amantes inconscientes que ainda deslizam no poço escorregadio dos amores efêmeros. Eu não. Eu cheguei no fundo. E com o lodo na cintura descobri que não posso mais chorar. Acabaram os comprimidos, ficaram as culpas. A biologia privou meu direito de chorar. Esse darwinismo escroto que insiste que é preciso evoluir, se adaptar. A cena, almodovoriana que só ela, embora com menos de 15 segundos, não foi bela: fiz uma careta que deve ter sido muito feia, eternamente registrada no globo ocular da vista do quarto sem espelhos. Mas não caiu uma lágrima. Há uma semana não engolia qualquer coisa. Foi, sim, um vício obscuro dos seus beijos, um feitiço daqueles em que você resseca, cem anos, num castelo há cem anos-luz de distância da realidade, esperando um beijo que nunca mais virá. Era o fim. Talvez fosse. Pra ajudar, todos os vinhos, os melhores, em promoção, nesse fim de ano em que todos parecem ter algo a celebrar. Há duas noites enchi minha cara de cerveja e vodka, falei coisas engraçadas com pessoas interessantes, mandei meia dúzia de salafrários à puta que os pariu, me fiz herói de passageiros invisíveis em risíveis aplausos quase criminosos; mas passou. Ninguém lembrará semana que vem. Talvez seja assunto em alguns meses ou anos, numa mesa de bar, falando daquele porre engraçado em que você não soube como chegou em casa e diga não lembrar pro assunto parecer mais engraçado que patético. Mas eu sabia. Eu tenho memória de mármore, gelado, frio, minucioso, calculista, vulcânico, resfriado; eternizada como uma estátua grega, perfeita, Vênus de Milo, sem braços. E aqui, afogado em todos os lençóis de nós dois, eu pisei no fundo do poço. É. Só quem já esteve lá, mesmo que por um dia, é capaz de definir essa masmorra; mas o problema é que estou gostando, estou me apaixonando por esse lugar. Pus uma foto nossa na parede deste porão, agora bucólico, e perfumei essa lama com lírios. Eu sempre gostei de lírios. Amarelos. Até plantei alguns numa parede isolada, cheia de cactos. Acendi uma vela para qualquer coisa que estivesse velando meu invisível. Qualquer companhia se torna agradável quando o silêncio marreta suas certezas. Pura imaturidade.
Mas é engraçado: algumas pessoas também escorregaram aqui pra me fazer companhia. Riem, choram, tomam mais vinho. Como se vinho matasse essa sede por quem já se foi. Esse vinho amargo, forte e seco não tem nada de celebração. E nessa risadaria triste vou me fragmentando, cada pedacinho do meu reino vai caindo. As coisas importantes vão afundando na areia movediça do embate com a realidade. Não tem mais ar puro aqui, só cigarros, evaporados. E respirando essa fumaça você encontra comprimidos, de alguma substância química que serve apenas para acelerar as horas. Escrevo frases quebradas, que talvez não signifiquem nada amanhã. Ou em cacos, me devolvam uma perspectiva fúnebre do que me aguarda em outras estações. Perder a mim mesmo dentro de você é como ser sugado para outra vida. Perder a liberdade de ser um, de me escolher em meio a tanto vaso quebrado. Essas veias escancaradas saltando de mim, olhos avermelhados e rugas que antes não haviam. O cabelo esbranquiçado revela o terror no espelho. Entope minha razão de todo horror de mim, de pensar que isso começou com amor. Tristão sabia; E só na morte encontrou sua Isolda, em meio a desespero, flores, facas, venenos e desencontros. Desprezo os espelhos. Se a realidade era tão óbvia, do que o otimismo poderia me salvar? Nesse buraco aqui, olhando pro alto, onde espero que alguém encha logo de terra. Mas não: a noite, vago como um morto vivo em busca de qualquer coisa que não seja preto e branco. Minha companhia se torna insuportável para aqueles que abandonaram meu buraco, agora minha casa. Essa tolice carente de quem decidiu nunca mais ser enganado. Fico atrás dessa coisa que não existe, apedrejando a realidade e recebendo minhas próprias pedras de volta nesse espelho metafísico. Esse verão eu fiz inverno - ou inferno, diriam os anjos. Não verei andorinhas, nem o mar. Nosso mundo, concomitante, me faz fugir pra esse buraco escuro ignorando o infinito. A noite tento apaziguar a dor olhando estrelas, pensando em outros mundos, desenhando mitos como sempre fiz; indagando esses mundo, até outrora, imaginários, se são reais, se são melhores que esse... E talvez sejam, mas não sejam para mim.

"Almeje sempre a perfeição."

Grita essa voz esquisita; eu me vejo como um monge, cego,​ casto e bêbado,​ de um​a religião estranha onde o fim do mundo se aproxima. ​Minha fé procura esconderijos nesse apocalipse. Meu bunker é aqui, debaixo desse edredom, enquanto você bombardeia flores que, de certo, murcharão. E você nem sabe disso agora. Eu sei. Sempre sei de tudo antes de quase todos. Mas ignoro. Ou ao menos, ignorava. Quanto mais o mundo passar, mais protegido estarei dese furacão de coisas, estilhaçando verdades até ontem absolutas, destruindo minha agenda com tantas farpas e pregos de fuga rasgando as páginas de papel. Pode rasgar; esse ano vai inevitavelmente passar e as agendas vão pro lixo. Esse sono drogado entorpecendo a bipolaridade destrutiva. Algo errado nesses remédios. Só fica a parte negativa. Sabe lá o que será de mim agora, sabe lá que coisa vou me tornar. Sabe lá quanta gente vou ferir pra me vingar de mim mesmo nessa dor imperdoável. Assim nascem os vilões? Assim nascem os antecristos que destroem o amor na incoerência de seus buracos obscuros tramando contra quem acredita? Não quero me tornar isso. Mas estou preso até a cintura. As escolhas morrem quando as correntes são mais pesadas que a bagagem.

Assim nascem os amantes cegos e errantes, aqueles que menosprezam maioridades por não serem capazes de enxergar a grandeza do mundo ensolarado. ​Do choro restaram os soluços; dos soluços fica o silêncio sepulcral de meu cômodo enevoado e fechado; os ecos de um dia inteiro, registrados como riscos na parede carcerária; é como um cabaré fechado, e eu na agonia de uma puta triste que ​viu seu amor se perder em seus próprios atos, ou em sua crença de que uma cama quente 2 vezes por semana salvaria uma eternidade inteira do desfiladeiro. Uma bruxa inocente condenada à fogueira. Nessa inquisição amorosa eu quem fui julgado, condenado e esquecido. Um nome no rodapé da história, apagado pelo suor da minha própria tentativa.

​Não quero ser isso. Só quero que essa cápsula se quebre, que esse livro se feche e que eu possa voltar a mim. Voltar 10 anos no tempo. Refazer minhas escolhas. Jamais poderei. Sei que jamais serei o mesmo. Jamais serei verão.

R.