29 de jun. de 2012

Leitura noturna - beijo de boa noite.


O que está na memória, não sai, nem com alvejante, cloro, ou qualquer substância que você queria usar pra se limpar. O que está dentro, fica pra sempre, por todas as vidas... E são tantas as vidas, meu caro, tantas... tantas manchas ainda por vir, tanta roupa suja que você vai tentar lavar em vão - mentem aqueles que dizem que existe cura pra uma mancha, uma mancha da vida; por isso é preciso estar atento, cauteloso, a todo minuto. Um pingo desse vinho derramado, de mau gosto no traje branquinho da vida que você sonha, no meio desse bacanal todo e lá estará, para sempre! Não há perdão, nem nos santos, capaz de remover a mancha dos tropeços que você deu com os copos na mão. Olha minha blusa manchada! Olha a sua! Olha a de todo mundo, respingada desse milagre estranho que é a vida...! Talvez por isso, tenham que passar. Mudar de recintos. Para que a gente não fique o tempo todo lembrando desses avessos estranhos que nem nós mesmos entendemos.Ou para aquele fulano, em outro salão de festas, veja aquela mancha como um deslize, um acidente, que nem foi tão acidente assim. Somos vítimas! Nos vitimamos o tempo todo; à mesma proporção que mijamos, nos vitimamos. Sorrimos amarelos nos salões da vida, manchando nosso traje de noite com belas e filosóficas lembranças agridoces de outras danças. Dançamos, e depois saímos, sabe-se lá pra onde. Alguns fazem planos, outros transcedem o próprio querer e acreditam em destino. Outros choram, achando que tudo acabou. Outros enchem de novo essa taça, e vão lamentar em outro salão. E há também os que não se incomodam, que dançam cheirosos com os perfumes da noite passada. Há todo tipo de coisa. Há todo tipo de memória, manchada, esturricada, presa a você. 
Só tome cuidado pra não enlouquecer, porque apesar dessa bagunça toda, o equilíbrio ainda é vital nessa e em todas as danças futuras. 



"As pessoas sofrem a vida inteira e se adaptam a isso; não se pode chegar de repente e tirar aquela certeza das mãos delas, é tudo o que elas têm. Nunca desmereça os problemas alheios - o sofrimento é, para muitos, um prêmio que comprova essa única grandeza: ser um sobrevivente. E já basta.
(...)
Está tão satisfeito; como uma criança que redescobre um brinquedo que estava sumido embaixo do armário. Uma mulher que arruma o armário e encontra aquela blusa que deixa seus seios lindos e ela nem lembrava mais que tinha. A descoberta de coisas simples, que são suas e estão à mão. Mas você é complicado e quer o que está distante, difícil, com os outros... Tolo, vá buscar nas suas gavetas as coisas que você tanto quis e redescubra a alegria em tê-las."