27 de jul. de 2012

Eu tenho a minha Islândia e você não sabe.




Meu pequeno reino, não muito maior que a Islândia.
Gelado, triste e vulcânico. Com uma infinidade de nações imensas e risonhas confundindo seu nome.
E tão bem construído em cima de frangalhos e cinzas, tão elaborado, erudito. Tão lúdico, contraditório e ao mesmo tempo tão provocador.
Não tem nenhuma intenção esse reinado pequeno, com algumas pequenas muralhas e canhões, só por precaução.
Fica isolado, no meio do mar. Pouca gente conhece, pouca gente descobre, ou pisa e se vai. Mas é meu reino, minha casa, meu castelo interior. As estrelas dividem o céu com pequenas auroras boreais. Efusivas e passageiras, como devem ser os amores cantados. 
Mas milimetricamente elaborado, construído com uma perfeição tão pouco global. Na minha ilha não há guerra ou paz. Há a sensação; um passado queimado de carvão nas lareiras, e algumas donzelas que se foram, princesas e plebeias. Nem mais donzelas...
Nem na cegueira da tarja preta e do pijama escuro eu consigo deixar de contemplar. Mas é meu, só meu.
Coragem, mesmo, tinha Romeu. Mas esse rapaz confuso era de outro reino. E os tantos outros romeus que cavalgam nessas ruas lapidadas não são nada shakespearianos: não renderão peças ou tragédias eternas através dos séculos. São seculares, mas tristes. Não expressaram em palavras e romantismos teatrais às suas princesas ou plebeias, que por sua vez, nada possuem de Julieta. Assim as histórias se picam, se perdem na névoa fúnebre do bosque do acaso. 
Há também alguns dragões; e onde não há? Os meus sopram lentos e lendários as paredes que nunca se destroem. São engraçados, enfadonhos, não provocam medo nos cavaleiros. Somente o tédio barulhento de suas asas ressonando no céu silencioso. Quando chegam as manhãs, chegam tristes, serenas e curtas, como um véu transparente. Firme mesmo é a noite debruçada no horizonte, abraçando todos os dragões com seu manto de Nit.
Mas ainda assim é meu reino, perpétuo em sua devoção diária, desde da praia até a mais alta torre.
Espero, do alto, uma rebelião que nunca ocorre; um atear do hálito inexorável do manto do destino, que possa no mínimo fazer tremer essas paredes. Mas ele nunca vem. Nunca muda. Até as nuvens são eternas e imutáveis, não fazem desenhos no horizonte. Não inspiram, não chovem, não nevam. Uma pequena histeria de amantes enterrados sob o cume dos vulcões, ressonam. Mas não cospem, estão extintos. Um continente perdido de sentimentos monótonos. Sim, o perfeito é monótono e fantasma, não há o movimento, não há encenação. Não há entretenimento ou aventura, abdicação ou romance. Só repetição. Se eu fosse ator, a vida seria isso. E o mais engraçado é que é. No fim, apenas é.

E eu nem sou homem suficiente pra tanto estrago.

24 de jul. de 2012

Uma epifania no epitáfio.


Sou negativo. Não sempre, mas maior parte das vezes. Ou me tornei; dessas coisas que não se controla, se fixa na essência e muda todas as fórmulas. A questão é que quando um ser, uma partícula negativa, encontra uma positiva, gera-se o choque. Um princípio tão físico, quanto matemático. Só não confunda negativo com pessimista. A diferença - acredite - é abissal e linguística.
Perdi aquela disposição insana de mergulhar fundo no âmago na natureza humana. Não existe graça em viver na previsão dos comportamentos. Quero resolver dar uma chance pro sobrenatural, pro improvável, pro inexplicável. Mas as chances da realidade não estão a meu favor. A realidade é um soco na cara de quem sofre de insônia; insones sonham pouco. 
A vida é tão imediata,  ao mesmo tempo requer tanta paciência... 
Ainda hoje passei o dia pensando no paradigma da felicidade. Em quando o ser humano realiza seu ideal de felicidade. Aquele momento só dura umas semanas, talvez uns meses. Depois, precisa ser ampliado ou dissolvido; aí só restam duas pseudo-virtudes: a melancolia ou a ambição. Demais, ademais, o desejo de mais, ou a tristeza pelo excesso. É onde moram os milionários suicidas, alpinistas sociais e os tantos clichês dos que conquistam e abandonam. Faz sentido essa idéia de se sabotar, quando não se tem uma meta na mira dos olhos, ou um mapa, pelo menos. Mapas que mancham, olhos que cegam, e tudo se torna essencialmente infame. Assim, de repente, perdi a vontade de definir...
R.


19 de jul. de 2012

"Desesperancento" (Não fará bem.)


Estou morrendo. Sinto isso a cada dia mais. Não sinto como as outras pessoas, que morrem sem perceber. Sinto milimetricamente cada pedaço de mim esvair, egoísta, criando pernas para se perder dos meus olhos pra sempre. Como pequenas aranhas nas frestas despercebidas. Venenosas, sim, como qualquer coisa inanimada que ganha vida. Zumbis. E ironicamente também me torno um zumbi, vendo pedaços meus esfarelados, espalhados e - por constatação - mortos. A única coisa que sobra são essa fome e essa sede de amor, que nunca passa. Cada momento tendo seu lindo levemente descolorido, lenta e dolorosamente, cada pedaço do espectro. Uma sépia sem charme. Paulo dizia que a única coisa que restava mesmo era o amor. Paulo era apóstolo, sabe Deus com que matava sua sede. Eu só tenho a sede. 
Estou bêbado de vazio. Cansei de gritar, cansei de me debater. Estou naquele momento m que você se entrega aos fatos e lamenta. Uma vela acesa no canto, talvez um gemido pequeno, imperceptível Não quero acordar os vizinhos. Não quero escandalizar os homens com esse demônio com quem me compactuei. Não quero, não quero nada. Queria poder apenas dormir; já que mesmo as plantas sentem sede, em sua eterna expressão incoerente. Sou uma samambaia, crescendo pra baixo, com raízes peludas. Não, nem posso dizer que sou samambaia. Não sou coisa viva alguma. Estou nas últimas gotas... aquelas que escorrem do copo quebrado em seus últimos cacos, ou aquele resto de líquido que impregna o fundo da garrafa. Nada ressoará, exceto o eco, o som do vento. Os cacos talvez, caindo no chão. Nada mais. Depois, silêncio e corte. E sabe-se lá o que mais.
Meus caros: estou cansado, de verdade. E sem saída. Deus meio que se esqueceu de chover por aqui...