22 de jun. de 2016

Um Segredo num segundo.




Existem maneiras mais humanas de afastar uma pessoa que a indiferença. A honestidade é uma delas. A honestidade é a última esmola de quem se importa. Talvez seja esse um dos reais motivos de me cercar da solidão: as pessoas não suportam a honestidade. Não sou uma ilha mas minha ponte é uma só...

21 de jun. de 2016

Amargor


Estava tudo ficando cinza: sua barba, seus cabelos, seu coração e seus sonhos mais honestos. Talvez fosse isso que o tempo fizesse, tirasse as cores das coisas, antes de devolvê-las à terra. Por fim ficou a visão, agora na lente. Tornando nítida a ilusão do mundo que passava. Estava ele agora buscando num cigarro e num texto (seus melhores amigos) o inevitável naufrágio de si. Era tudo que restava, cinza, solidão e sonhos desbotados. Podia diluir na acidez de um vinho, não fosse o trabalho. Essas agendas nos fazem engolir a realidade a seco. Distração, planilhas, compromissos que não dão em nada. O sentido da noite ganha um fundamento vazio. O descanso não vinha. Era esse ele agora, desbotado pelo tempo. Não há anodos contra o tempo e o desencanto. O sangue poderia circular puro, não fossem as drogas atenuantes que fazem esquecer quem é de verdade. Endorfina, chocolate, choro e aspereza. A manhã subiu vazia, acordou antes do sol e sem a certeza que tinha dormido. Os remédios perderam seu efeito: a tristeza triunfou de mãos dadas à decepção. Rei e rainha num desfile alegórico adornado de solidão. Ele começa a terceirizar os compromissos, fuma mais um cigarro enquanto seu estômago rosna a lembrança da refeição esquecida. Tatuou no rosto aquela frase que queria ser feliz. A tatuagem desbotada, agora também cinza, lembra que ser feliz não era de sua natureza. Não existe bondade ou maldade em seu mundo, só fatos imutáveis, como uma escultura grega de mil anos: imutáveis e conservadas para o futuro. Quisera ele agora ir para buscar longe, criae outro mundo com outros personagens que não fossem os vilões eternizados na galeria de sua mente em guerra. "Não adianta gritar rapaz. Você está sozinho! Desde sempre e para sempre!" A velhice do Espírito contrasta a aparência. Tatuou também um sorriso, sempre igual. Sempre morno. Sempre simples. Aspirina, aspartame, e mais drogas: "você precisa aumentar a dose!" Mas a alegria no sangue só agrada aos vampiros, agora tantos. Esperando ele segue, até acordar daquele sonho. Por hora, por anos, tudo é cinza, até se diluir em cinzas.


17 de jun. de 2016

Oração de minha ressurreição


Tenho agora, arrastados por todos os caminhos errados, meus pés calejados e a bigorna de meu cansaço. Alguns grilhões de culpa. A experiência e algumas cicatrizes. O raciocínio de um ex combatente. A loucura de um coração que ainda bate. E bate. E bate. Até doer. A angústia de quem já quase desistiu de um mundo bom. Os olhos de quem tantas vezes já testemunhou o abismo, e foi até empurrado por mãos eluvadas de bondade. Sobrevivi: contundido, arranhado, exausto. Mas aqui. Não: esse manto frio de amargura só me faz lembrar do sol. Que tudo tem cura, mesmo que a cura seja o fim. Por fim, permaneço. Volto como Sol, ardendo e evanescendo o veneno das palavras vazias e promessas não cumpridas. O vômito seco da incapacidade. Volto. E voltarei. Até o último sopro. Porque sou teimoso desde que nasci; ninguém vai me convencer que não vale a pena tentar. Lento, sigo. Não atrás de alento. Mas de algo que eu mesmo não posso descrever. Nem quero. É meu! E me ensinou a não permanecer onde não harmoniza. Fico, mas sigo. Amém.

R.


6 de jun. de 2016

Pensou com o coração

"...Já sabia disso intrinsecamente, embora as roupagens de suas viagens cobrisse as cicatrizes na pele, e o manto remendado das certezas disfarçasse a realidade fria: possuir já era a primeira forma de perder..."